Infidelidade de Graça Amorim agride a justa causa na lei

O TSE entende que, por vigorar no Brasil o sistema representativo, o mandato eletivo pertence ao partido

Por Miguel Dias Pinheiro, advogado,

O procurador eleitoral junto ao eg. Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE-PI) sustentou em parecer que a atual vereadora Graça Amorim teria cometido "infidelidade partidária" por ter mudado de partido na chamada "janela partidária". O d. parecer foi apresentado em uma ação proposta pelo Partido Progressista (PP).

Infidelidade partidária, na regulação mais elementar, é aquela que não observa as diretrizes do partido político à qual a pessoa é filiada; ou, em outro caso, quando esta abandona o partido sem justificativa. 

O TSE entende que, por vigorar no Brasil o sistema representativo, o mandato eletivo pertence ao partido. Além disso, a Lei dos Partidos Políticos prevê, no artigo 22-A, que perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, da sigla pela qual foi eleito.

Observem as expressões: SEM JUSTA CAUSA. Aqui reside o "x" da questão.

O art. 22-A, da legislação invocada, não pode ser aplicado sem a observância do seu respectivo parágrafo único, que CONSIDERA JUSTA CAUSA a desfiliação partidária nas seguintes hipóteses:

1.    mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;

2.    grave discriminação política pessoal;

3.    mudança de partido efetuada durante o período de 30 dias – a chamada “janela partidária” – que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.

Ora, se houve "justa causa" legal que autorizou Graça Amorim a mudar de partido, como, então, cogitar-se sobre punição com perda do mandato assumido recentemente. Parece-me muito clara a questão. E bastante elementar.

Considerada como uma justa causa para a desfiliação partidária, a "janela partidária" possibilita a mudança de partido, situação justificada legalmente (sem usar qualquer procedimento judicial) para consubstanciar a "justa causa". 

Na conclusão, somente há infidelidade partidária quando NÃO houver "justa causa". Evidentemente! 

No caso concreto, portanto, houve a "justa causa" autorizada pela própria lei para, enfim, a desfiliação da vereadora. Ainda que os votos possam pertencer ao partido, a "justa causa" consubstanciada pela “janela partidária" - que alterou a Lei dos Partidos Políticos - abre uma EXCEÇÃO À REGRA, para não possibilitar punição alguma à pessoa que usou a lei para mudar de partido.

O TSE já consolidou o entendimento de que só poderá usufruir da “janela partidária” a pessoa eleita que esteja no término do mandato vigente. Ou seja, vereadores(as) só podem migrar de partido na janela destinada às eleições municipais, e deputados federais e estaduais naquela janela que ocorre seis meses antes das eleições gerais.

Em consulta no TSE, o então ministro Admar Gonzaga afirmou  em seu voto que  a interpretação da "justa causa" que se configura exceção à regra da fidelidade partidária deve ser estrita nos exatos termos legais. “O vereador poderá se desfiliar do seu partido com justa causa apenas no prazo da janela partidária que coincidir com o final do seu mandato, ou seja, nas vésperas das eleições municipais. Do mesmo modo, o detentor do cargo proporcional, como deputado federal e distrital, poderá fazer jus à janela partidária na proximidade de uma Eleição Geral”, esclareceu o ministro.

Segundo o professor Michael Mohall, foram criadas as chamadas “justas causas”  para imprimir uma certa flexibilidade político-eleitoral. Porque as pessoas mudam de ideias, mais do que isso, veem perspectivas eleitorais melhores em outros partidos e é natural isso. Mas, também, não pode ser como era antes, quando isso acontecia de forma indiscriminada. Foi justamente por essa flexibilidade que nasceu e se viabilizou a "janela partidária".

Admitir que houve infidelidade partidária para o caso da vereadora Graça Amorim é “jogar no lixo” o princípio constitucional da “justa causa”.

Fonte: Portal AZ

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