A crise política em Parnaíba, com o prefeito Francisco Emanuel (PP) exonerando aliados e nomeando familiares, vai além de um mero rearranjo de cargos. Ela revela uma estratégia clássica de autopreservação, onde a aparente ruptura serve, na verdade, para evitar que o poder seja de fato fiscalizado. A situação lembra a máxima de O Leopardo — "Se queremos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude" —, mas com um ingrediente ainda mais perverso: a mudança não só mantém o poder nas mãos de um grupo, como também impede que esse mesmo grupo seja investigado.
Francisco Emanuel não é um outsider. Ele foi secretário na gestão de Mão Santa, o mesmo ex-prefeito que agora demitiu com estardalhaço. Sua ruptura teatral com o antigo aliado coincide com um momento delicado: o município estava prestes a instalar uma CPI da Saúde e uma CPI da Educação, que poderiam escancarar irregularidades de gestões passadas — incluindo a dele próprio, já que ele fazia parte da máquina administrativa anterior. Ao promover um "terremoto" na prefeitura, exonerando todos os comissionados e distribuindo cargos a parentes e aliados, ele não apenas consolida seu controle, mas também desarma a fiscalização.
Afinal, quem assinaria um pedido de CPI se os vereadores agora estão sendo contemplados com cargos ou têm aliados no governo? Quem investigaria problemas da gestão anterior se muitos dos atuais ocupantes do poder também estiveram nela? A jogada é astuta: ao fragmentar o poder e cooptar possíveis opositores, Emanuel transforma a ameaça de uma CPI em algo politicamente inviável. Os vereadores, muitos deles ex-integrantes ou aliados da gestão Mão Santa, perdem o interesse em mexer num vespeiro que pode atingi-los também.
É o "Gattopardo" com sotaque piauiense: trocam-se os nomes, redistribuem-se os cargos, mas o sistema segue intocado. A diferença é que, em Parnaíba, a mudança não serve apenas para manter o poder, mas também para blindá-lo. Enquanto isso, as CPIs morrem na praia, os problemas não são investigados, e a população fica sem respostas — exatamente como convém a quem quer que tudo continue como está.
No fundo, o que aconteceu em Parnaíba não foi uma revolução, e sim um pacto de silêncio disfarçado de renovação. E a pergunta que fica é: quando a cidade conseguirá romper esse ciclo, em que até as supostas mudanças são feitas para evitar que algo mude de verdade?
Flávio Furtado de Farias
Professor da UFDPar