Brasileiros escravizados em Myanmar chegam ao Brasil com relatos de tortura

Vítimas de tráfico humano relatam abusos e alertam sobre os perigos de falsas promessas

Dois brasileiros, Luckas Viana dos Santos, de 31 anos, e Phelipe de Moura Ferreira, de 26 anos, que foram vítimas de tráfico humano no Sudeste Asiático, desembarcaram na quarta-feira (19) no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo. Após meses de sofrimento, eles relataram alívio por estarem de volta ao Brasil.

Foto: Reprodução | Antônio Carlos Ferreira | Arquivo Pessoal
Os jovens brasileiros foram seduzidos por promessas de emprego na Tailândia.

Os jovens foram seduzidos por promessas de emprego na Tailândia, mas acabaram sendo sequestrados e levados para Myawaddy, em Myanmar, país que vive em guerra civil, onde foram forçados a trabalhar para uma máfia local de origem chinesa. Os brasileiros eram obrigados a aplicar golpes financeiros pelo WhatsApp, arrecadando recursos para a organização criminosa. Caso não alcançassem as metas impostas, eram submetidos a torturas diárias, incluindo espancamentos e choques elétricos.

“Muito difícil estar lá. Eles batiam na gente quase todos os dias. Tinha máquina de choque também. A gente sofreu bastante. Essas aqui são marcas das algemas, a gente ficava 17 horas presos assim”, relatou Luckas dos Santos. O jovem ainda alertou sobre os riscos de aceitar propostas de emprego no exterior: “Eu peço para o pessoal ver bem as oportunidades que eles estão recebendo, porque, como aqui no Brasil o salário não é tão bom, fica a ilusão, porque é como se fosse cinco, seis vezes mais [o salário]. E, no caso, eu aceitei [a proposta] porque eu já estava na Tailândia e eu estava procurando alguma coisa lá. Um amigo me mandou no grupo, e achei que era algo sério”, acrescentou.

As vítimas também tentaram fugir do local onde estavam aprisionadas, mas foram capturadas e severamente espancadas. Phelipe descreveu o cenário de vigilância extrema, onde cerca de 300 homens armados protegiam o complexo. “A gente não conseguiu fugir. A gente bolou o plano, só que nesse plano a gente tinha que escalar três montes e correr mais 22 quilômetros para tentar cruzar um rio para chegar na Tailândia. Eu consegui escalar um monte. No terceiro monte, veio um guarda com uma faca e mandou eu voltar. E foi isso. Eles pegaram todo mundo”, relembrou Phelipe.

A libertação foi possível graças à intervenção da ONG Exodus Road Brasil e ao Exército Budista Democrático Karen (DKBA), grupo rebelde armado que domina a região. O retorno ao Brasil foi custeado pelo Itamaraty, que também intermediou negociações com as autoridades locais desde outubro do ano passado.

Em nota anterior, o Ministério das Relações Exteriores destacou seus esforços para conscientizar brasileiros sobre os riscos do tráfico humano, divulgando guias e informes sobre falsas ofertas de emprego no exterior, especialmente na região do Sudeste Asiático. A experiência vivida por Luckas e Phelipe é um alerta para todos que procuram oportunidades fora do país.

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