A organização criminosa de Bolsonaro e a competência do Supremo

Crimes federais que impedem modificação de competência/foro

Por Miguel Dias Pinheiro,

Os crimes contra o Estado Democrático de Direito são condutas que atentam contra os fundamentos e o funcionamento do regime democrático brasileiro, incluindo suas instituições e o exercício dos direitos políticos, sociais e individuais.

Estes delitos estão previstos no Título XII, do Código Penal (artigos 359-I a 359-P), incluídos pela Lei 14.197/2021, que revogou a antiga Lei de Segurança Nacional.

Entre as principais categorias dos crimes, estão aqueles praticados contra as instituições democráticas, incluindo tentativas de impedir ou perturbar o funcionamento do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal e outras instituições, entre as quais o regular funcionamento da Presidência da República.

Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito

Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.

Golpe de Estado

Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.

O Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia e professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS, pós-graduado pela Universidade de Salamanca, Rômulo de Andrade Moreira, aponta para uma doutrina importante no sentido de dirimir qualquer dúvida sobre a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar Bolsonaro e sua turma.

Segundo o professor, os novos tipos aditados ao Código Penal devem ser considerados como crimes políticos (em sentido estrito), tais como eram assim reconhecidos os antigos delitos tipificados na Lei de Segurança Nacional. Porque atentam contra a integridade nacional, contra as instituições democráticas, contra o funcionamento das instituições no processo eleitoral e, finalmente, contra o funcionamento dos serviços essenciais destinados à defesa nacional, com o fim de abolir o Estado Democrático de Direito.

Como tais, crimes de competência privativa da Suprema Corte. Ou seja, crimes federais que impedem modificação de competência/foro. É caso do ex-presidente Bolsonaro e sua organização criminosa. Os atos criminosos praticados de 2021 até 8 de janeiro de 2023, segundo a doutrina do mestre Basileu Garcia, são delitos contra a ordem política do Estado.

De conformidade com a doutrina de Aníbal Bruno, objetivamente, “será político todo crime que ofende ou ameaça direta ou indiretamente a ordem política vigente em um país”; ... e, subjetivamente, "deve ser considerado político a partir do móvel que levou à prática do crime".

No caso específico da organização criminosa de Bolsonaro, tendo ele com líder, segundo a denúncia do procurador-geral da República Paulo Gonet, o mestre Aníbal Bruno estabelece as distinções entre crimes políticos próprios, os que ofendem a organização política do Estado; crimes políticos impróprios, os que acometem um direito político do cidadão. E, ainda, crimes políticos puros, os que têm exclusivamente caráter político, e crimes políticos relativos, compreendendo os complexos ou mistos, que ofendem ao mesmo tempo um direito político e um bem jurídico tutelado pelo Direito Penal comum, e os crimes comuns conexos a crimes políticos. Doutrina perfeita para enquadrar Bolsonaro e sua quadrilha para que sejam julgados no STF.

Na linha de raciocínio, o grande penalista Nelson Hungria afirmava que “os crimes políticos (ou político-sociais) agridem a própria segurança interna ou externa do Estado ou são dirigidos contra a própria personalidade deste, ao contrário do crimes comuns (em sentido extensivo) que atacam os bens ou interesses jurídicos do indivíduo, da família e da sociedade, penalmente protegidos pelo Estado”.

Acrescento, pois, que os crimes comuns, como a destruição dos palácios dos três Poderes da República em Brasília no dia 8 de janeiro de 2023, especificamente, são abarcados pelos crimes políticos, por maiores e mais graves, inserindo-se todos na competência do Supremo por motivos políticos.

O procurador e professor Rômulo Moreira ainda assevera que, em nenhum dos novos casos penais será possível o acordo de não persecução penal, pois, ainda que a pena mínima seja inferior a quatro anos, a conduta punível terá sido praticada (de uma maneira ou de outra) com violência ou grave ameaça, circunstância que impede o referido acordo. Será possível, porém, desde que presentes os requisitos legais, a proposta de suspensão condicional.
 

Fonte: Portal AZ

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