O art. 299, do Código Eleitoral, não pode ser aplicado isoladamente

Não é de fácil desate a interpretação e a aplicação do art. 299, do Código Eleitoral, no que concerne ao ilícito de "crime eleitoral".

Por Redação do PortalAZ,

Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, seja ela na esfera policial ou eleitoral, é necessário, primeiro, saber-se se ocorreu o dolo específico na identificação do autor do fato para conseguir obter votos; segundo, é necessário que a conduta do(a) suposto(a) infrator(a) seja direcionada a eleitores identificados ou identificáveis. Porque não há falar-se em corrupção eleitoral mediante o compra de votos sem que a investigação ou a denúncia individualize eleitores(as) supostamente aliciados(as).

Foto: DivulgaçãoMiguel Dias Pinheiro, advogado

No indiciamento ou na acusação devidamente formalizados, deve-se indicar qual ou quais eleitores(as) teriam sido beneficiados(as) ou aliciados(as). A jurisprudência dominante e predominante dos tribunais superiores aponta que, "...ausente a adequada identificação do corruptor eleitoral passivo, como impõe a hermenêutica d art. 299, do Código Eleitoral, deve ser reconhecida a inépcia da denúncia e a ausência de justa causa para o prosseguimento da acusação..."

"Corrupção eleitoral. Art. 299 do Código Eleitoral. Eleitor com direitos políticos suspensos. Fato atípico. (...) 1. Nos termos do art. 299, do Código Eleitoral, que protege o livre exercício do voto, comete corrupção eleitoral aquele que dá, oferece, promete, solicita ou recebe, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita. 2. Assim, exige-se, para a configuração do ilícito penal, que o corruptor eleitoral passivo seja pessoa apta a votar (...) (Ac. de 23.2.2010 no HC nº 672, rel. Min. Felix Fischer).

Assim, o art. 299, do Código Eleitoral, não pode ser aplicado isoladamente. A ele devem se juntar os arts. 333 e 317, do Código Penal, que definem a corrupção ativa e passiva, ou seja, oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício; solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem, respectivamente.

Sendo assim, fica claro que o Código Eleitoral optou por abarcar as duas modalidades de corrupção acima descritas (ativa e passiva) dentro do mesmo artigo. Ou seja, o art. 299, do Código Eleitoral, prevê a corrupção eleitoral nas modalidades ativa e passiva.

No processo político-eleitoral, obrigatoriamente, tem que haver "corruptor(a) e corrompido(a). Não existe um sem o outro. Há, sim, corrupção tanto do político como do eleitor. Um que dar e o outro que recebe. Na corrupção eleitoral há duas partes em um só crime.
O crime de corrupção eleitoral é de natureza "bilateral".

Veja o analítico: dar - conceder, entregar (corrupção ativa); oferecer - colocar à disposição (corrupção ativa); prometer - obrigar-se a prenunciar (corrupção ativa); solicitar - pedir, requerer de forma ostensiva ou velada (corrupção passiva); receber - acolher, tomar posse, adquirir (corrupção passiva).

A análise nos remete à hermenêutica jurídica, ocupando-nos com a interpretação das normas e estabelecendo métodos para a compreensão legal da corrupção eleitoral. Assim, ofende o princípio constitucional do devido processo legal a acusação sem a identificação e/ou os(as) identificáveis dos(as) eleitores(as) corruptos(as).

Fonte: Por Miguel Dias Pinheiro, advogado

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